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03/11/2013 às 10:03, atualizado em 12/05/2016 às 18:04

Ciganos do DF ganham mais dignidade ao serem alfabetizados

“Tenda Escola”, criada pelo GDF dentro de acampamento, ensinou 50 pessoas a ler e escrever e contribuiu para melhoria da qualidade de vida

Por Fábio Magalhães, da Agência Brasília


. Foto: Mariana Raphael

BRASÍLIA (3/11/13) – Vítima de preconceito e discriminação por causa de seus costumes e crenças, a comunidade cigana do DF, que por muitos anos foi refém do analfabetismo, ganhou mais um aliado na busca de melhores condições de vida: a educação oferecida em uma tenda do GDF, dentro do acampamento, em Sobradinho.

 

A comunidade, formada por 150 pessoas distribuídas em 21 famílias, segue a tradição nômade e se muda com frequência. No entanto, há oito anos, os integrantes da etnia Calon se estabeleceram em um terreno de três hectares no Núcleo Rural Córrego do Arrozal, Chácara 163, na BR-020.

 

Nesse local, onde os ciganos levam uma vida simples ao lado de suas plantações e da criação de pequenos animais, um espaço chama a atenção dos visitantes: a tenda em que, desde o dia 3 de julho, são oferecidas aulas de alfabetização e onde 40 alunos ganharam uma nova visão de mundo pelo conhecimento.

 

“Tenho um filho com paralisia cerebral e quando recebia os papéis nos hospitais não sabia o que era receita ou pedidos de exame, porque não sabia ler. Era uma angústia muito grande que consegui vencer”, orgulhou-se a cigana Jairan da Conceição, 42 anos.

 

O sonho da cigana, conforme ela mesma conta, era ter a oportunidade de tratar o filho Aparecido Alves, de 9 anos. Porém, a falta de estudo, por muitas vezes, a deixou em pânico por não saber ler o receituário para dar remédios ao filho durante uma crise da doença, por exemplo.

 

Agora, quatro meses após o início das aulas oferecidas pela Secretaria de Educação em parceria com a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, Conceição recebeu o diploma de conclusão do curso e, otimista, prevê uma mudança de vida ao traçar planos para o futuro.

 

“Depois dessas aulas, aprendi a ler e escrever e quero continuar estudando para ser enfermeira, para ajudar o meu filho e a minha comunidade. Esse curso ajudou não só a mim, mas a todos os que participaram, porque agora teremos mais oportunidades, teremos dignidade”, frisou.

 

Para a maior parte dos ciganos que fizeram o curso de alfabetização, a iniciativa do GDF representa o fim de situações vexatórias vivenciadas por eles cotidianamente pelo fato de não serem instruídos e de não saberem, por exemplo, assinar o próprio nome em um documento de identificação.

 

O cigano Rogério de Moura, 21 anos, foi uma das pessoas da comunidade que muito sofreu por não saber ler. Vendedor, o jovem sai com frequência do acampamento e utiliza o transporte público para chegar a diversos locais do DF. Mas, por não conseguir identificar o itinerário do ônibus, passou por diversos contratempos.

 

“Como eu não sabia ler, peguei ônibus errados muitas vezes porque as pessoas informavam errado, sem contar o fato de que tudo na vida se torna mais difícil para quem não é alfabetizado. Até tentei ir para a escola, mas fui vítima de preconceito e desisti”, contou.

 

REJEIÇÃO – A maior parte dos ciganos da comunidade instalada em Sobradinho não é alfabetizada. Alguns, assim como Moura, chegaram a frequentar escolas regulares, mas, pelo fato de serem mais velhos e não alfabetizados, foram alocados em turmas com crianças, o que, pelas desigualdades, os fez desistir.

 

A saída encontrada pelo governo local para proporcionar a inclusão desse grupo foi criar a “Tenda Escola”, que formou seus primeiros 50 alunos na semana passada, com direito a solenidade no Teatro de Sobradinho.

 

“Nunca tinha pegado em um lápis ou em um caderno antes, e meu sonho era aprender a ler e escrever. Isso é gratificante”, destacou a cigana Leila dos Santos Alves, 34 anos.

 

Para o líder da Associação Cigana da Etnia Calon do DF, Elias da Costa, ao participar das atividades oferecidas pelo GDF, a comunidade tem mais chances de desenvolvimento, de conseguir melhorias e de lutar pelas causas defendidas pela cultura cigana.

 

“O governo desempenhou um papel muito importante, porque sofríamos constantes discriminações por não sermos alfabetizados. Agora, todos eles terão a chance de ir a uma escola e continuar estudando”, acrescentou Elias da Costa.

 

De acordo com o secretário de Promoção da Igualdade Racial, Viridiano Custódio, é função do Estado promover ações que mudem a vida de pessoas, como os ciganos, que eram excluídos socialmente pelo simples fato de não saberem ler ou escrever.

 

Custódio lembrou que, além de facilitar o dia a dia, as aulas de português e matemática os ajudam também a ter voz ativa junto ao governo, uma vez que saberão como se comunicar e ter mais representatividade para defender sua cultura, ideais e interesses.

 

“A discriminação que existia com os ciganos que iam para a escola era muito grande, e isso contribuiu para a evasão escolar. A criação da ‘Tenda Escola’ foi o primeiro passo que demos, e agora eles têm que continuar estudando. Nós não fizemos mais do que a obrigação, que é promover a igualdade e a inclusão”, destacou o secretário de Igualdade Racial.

 

As aulas da segunda turma se iniciaram no dia 22 de outubro e irão até o dia 5 de abril de 2014. Participam das atividades os ciganos que não foram contemplados na primeira turma.

 

Os que acabaram de concluir o curso também comparecem às aulas, mas como ouvintes, enquanto não são inseridos no ensino regular para cursar a Educação de Jovens e Adultos e, assim, poder realizar seus sonhos de forma digna.

 

(F.M./J.S.*)