16/07/2021 às 13:41, atualizado em 16/07/2021 às 14:07

“A denúncia é a forma que as mulheres têm de buscar a proteção do Estado”

Secretária de Mulher conta como o GDF está trabalhando para conter e combater os casos de agressão

Por Ian Ferraz, da Agência Brasília I edição: Carolina Jardon

Políticas públicas nunca são demais quando o assunto é a proteção e promoção das mulheres. Neste sentido, a Secretaria da Mulher não tem medido esforços para oferecer assistência no Distrito Federal, seja com ações itinerantes, programas e espaços adequados.

Em conversa com a Agência Brasília, a secretária Ericka Filippelli falou sobre as medidas do governo que ajudaram na redução dos casos de feminicídio, que reduziram significativamente no ano passado. “Temos a maior queda no índice de feminicídio do país em 2020. Foi mais de 46% de diminuição em relação a 2019”, contabiliza.

Segundo ela, o esforço do governo está em dar condições para que as mulheres denunciem a violência. “É importante falar dos canais de denúncia, temos o aplicativo chamado Proteja-se, que é ligado ao 180 e as mulheres podem baixar no telefone para pedir ajuda. Ele, inclusive, pode ser utilizado por pessoas surdas”, completa.

Filippelli aborda ainda a criação de programas como o Acolher, Sinal Vermelho e a Jornada Zero. Esse último, inclusive, completa nesta sexta (16) seu ciclo de ações educativas de estímulo à denúncia em Samambaia. A secretária conta ainda as ações voltadas às mulheres do campo, que já passou pelas comunidades da Chapadinha (Sobradinho) e Assentamento Oziel Alves (Planaltina).

Na semana passada foi publicada portaria que estabelece o Programa Acolher, que reorganiza o atendimento nas unidades da Secretaria da Mulher. Qual o objetivo disso?

O objetivo maior do programa é trazer a mesma diretriz, objetivos, metas e estratégias para todos os equipamentos gestados pela secretaria. Vamos trazer a institucionalização desses equipamentos. Independentemente do governo, esses equipamentos vão funcionar da mesma forma, trazendo um olhar humanizado para todo atendimento. Iniciamos o programa pela Casa Abrigo e em breve vamos lançar na Casa da Mulher Brasileira, nos Núcleos de Atendimento à Família e ao Autor de Violência Doméstica (Nafavds) e nos Centros Especializados de Atendimento À Mulher (Ceams).

Além do acolhimento das mulheres, a secretaria tem feito levantamento e estudos do resultado desses acolhimentos? O que tem sido possível extrair disso?

Temos um presente no DF que é a Câmara Técnica de Monitoramento dos Casos de Feminicídio, gestada pela Secretaria de Segurança Pública. Recentemente, a Câmara lançou o painel interativo do feminicídio, que traz em tempo real os dados sobre a violência, sobre o feminicídio, as tentativas de feminicídio e isso é muito importante. A partir desses dados a gente viu que 72,8% das vítimas de feminicídio entre 2015 e 2018 não tinham chegado até a delegacia. Isso mobilizou várias ações dentro da secretaria, como o deslocamento da unidade móvel para ações itinerantes, fomos até a Rodoviária do Plano Piloto, até festas e eventos e também outro dado que mostra uma realidade: a maioria das mulheres eram dependentes economicamente dos companheiros.

Após essas constatações, que medidas foram tomadas para ajudar as mulheres?

Criamos o espaço Empreende Mais Mulher, para ser um local de capacitação, qualificação e que tenha outro olhar de identificar mulheres que estejam vivendo situações de violência e, a partir disso, oferecer o acolhimento psicossocial. E por que essa inversão? Porque vimos que há uma alta subnotificação dos casos e há a questão da dependência econômica. Essa política tão exitosa que lançamos na agência do trabalhador em julho de 2019 e agora estamos replicando na Casa da Mulher Brasileira. Recentemente inauguramos um andar específico do Empreende Mais Mulher na Casa da Mulher Brasileira e no mesmo espaço teremos atendimento psicossocial, o atendimento dos nossos parceiros (PCDF, Defensoria, TJDFT). Lá também fazemos o encaminhamento para que essas mulheres se qualifiquem, se capacitem, sejam acompanhadas e possam desenvolver habilidades socioemocionais.  

E as mulheres da área rural, que não têm acesso à internet ou não conseguem ir à uma unidade de atendimento?

Lançamos a Secretaria da Mulher no Campo. A pauta da mulher rural é internacional. Quando a gente fala sobre políticas e ações voltadas para mulheres, a gente tem que ter um olhar especial para as mulheres do campo, das águas e das florestas. Existe uma política nacional que entregou ônibus para todos os estados para atender mulheres nas áreas mais distantes. Aqui no DF temos o Fórum Permanente das Mulheres do Campo e do Cerrado, onde a gente senta com elas e debate e daí nasceu a necessidade de levar as unidades móveis novamente para o campo e associar diversos serviços.

É um atrativo e também uma forma estratégica da mulher receber acolhimento psicossocial. Não adianta levar só o ônibus, ela não vai sair da sua propriedade correndo para buscar ajuda em um ônibus lilás que está passando pela área rural. Não adianta só passar o acolhimento, a gente precisa garantir que ela tenha segurança para denunciar. Daí surgiu a estratégia de trazer outros serviços do governo e fiquei feliz de ver o comprometimento do GDF com essa pauta. As secretarias de Segurança Pública, Saúde, Turismo, Desenvolvimento Social, Justiça e Cidadania, Agricultura, Educação e a Emater têm prestado um grande apoio.  

E, nesse período de pandemia, precisamos levar os serviços até as pessoas. Tivemos uma experiência importante em 2020, com o apoio da Secretaria de Saúde, em outubro, fizemos um mutirão levando médicos e enfermeiros para o nosso ônibus e promovemos o autoexame. Quando tinha alguma situação de risco para as mulheres nós conseguimos regular o atendimento na rede de saúde e assim zeramos a fila da mamografia na rede pública. Agora, em parceria com o Sesc e a Secretaria de Saúde criamos o programa Cuide-se, que será lançado e a ideia é levar essa ação itinerante para todas as cidades.

Vocês lançaram o programa Jornada Zero Violência Contra Mulheres e Meninas. Como surgiu essa ideia de fazer ações itinerantes?

Ele nasceu justamente dessa questão da subnotificação, entendendo que muitas vezes as pessoas poderiam não conhecer os equipamentos do governo que estão à disposição delas. Temos um programa premiado dentro dos hospitais regionais e que a população não sabia que poderia chegar no hospital e receber acolhimento nos casos de violência sexual e também não conhecia os núcleos de atendimento à família e também não sabia que no Cras as mulheres poderiam pedir ajuda. Informações como essa nos incentivaram a promover essa jornada e encontramos essa parceria com o Fundo de População da ONU, que sugeriu que tivéssemos lideranças de vários setores para visitar esses espaços e pudessem ser multiplicadores dessas informações.

No Paranoá, temos nove locais que as mulheres podem pedir ajuda; em Samambaia são mais de dez. Então é importante que a gente divulgue isso. Na Jornada Zero também promovemos bate-papos descontraídos, capacitação, falamos sobre a rede de apoio, conversamos com pais, conversamos com homens e a programação da jornada termina com uma caminhada reunindo os atores envolvidos e entregando os cartazes e folderes.

Com a jornada queremos engajar a sociedade entendendo que todos devem participar dessa luta contra a violência às mulheres, dessa causa, que devem meter a colher quando uma situação de violência ocorrer e estarem preparados para orientar uma mulher, encorajá-la a denunciar.

O mês de agosto marca a campanha Agosto Lilás, de conscientização e prevenção à violência contra a mulher. Quais as novidades para esse ano?

Teremos um seminário sobre a Lei Maria da Penha onde traremos uma visão bem básica, como se fosse um tutorial para ensinar as mulheres sobre o que é a violência, o que é a denúncia, o que verdadeiramente vive uma mulher que decide denunciar. Falaremos das medidas protetivas e ações do governo porque a gente precisa mostrar a realidade dessa rede de proteção e incentivar cada vez mais as mulheres a denunciar. Temos a maior queda no índice de feminicídio do país em 2020. Foi mais de 46% de diminuição em relação a 2019. No entanto, mais de 90% dessas mulheres não chegaram às delegacias, então há uma questão nacional e mundial de subnotificação e a gente precisa combater essa questão fazendo ações de divulgação, falando da temática, do que é verdadeiramente a denúncia, dos mecanismos do Estado para proteger essa mulher e encorajar esse ato de denunciar porque é a forma que o governo tem de proteger, acionar os dispositivos a fim de garantir a proteção.

A Clínica da Mulher – Centro Especializado de Saúde da Mulher (Cesmu) – está em funcionamento há nove meses. Como está o atendimento por lá?               

Acredito que a Clínica da Mulher é um exemplo de que muitas vezes você não precisa construir algo novo, só precisa de boas ideias e reunir esforços ao redor dessas ideias. Ali temos um exemplo de integração entre as secretarias da Mulher e de Saúde. Antes, era uma policlínica com baixa atividade dentro da rede de saúde e veio essa ideia de ter espaço voltado para atendimento às mulheres. Foram deslocados serviços para lá e o objetivo principal da clínica é oferecer serviço especializado para mulheres. Foram eleitos nesse primeiro momento alguns públicos prioritários, entre eles as mulheres em situação de violência que pudessem receber o atendimento e tivessem um olhar para outras especialidades, como a endocrinologia, ginecologia, acupuntura, e acesso também aos demais serviços da rede. É uma estratégia exitosa e vai ser muito mais apoiada a partir da criação de uma portaria que assinamos recentemente com a Secretaria de Saúde que traz esse olhar para a integração da mulher que está na ponta,  que chega nas unidades básicas de saúde até a clínica, criando protocolos de programas como o Cuide-se, que em breve a primeira ação será lançada.

Qual a mensagem que você deixa para as mulheres que ainda têm receio em fazer denúncias de violência?

O GDF tem trabalhado intensamente na proteção das mulheres e meninas da nossa cidade e na redução dos índices de feminicídio. É importante falar dos canais de denúncia, temos o aplicativo chamado Proteja-se, que é ligado ao 180 e as mulheres podem baixar no telefone para pedir ajuda. Ele, inclusive, pode ser utilizado por pessoas surdas. O mais importante é as mulheres saberem que a denúncia é a forma que as mulheres têm de buscar a proteção do Estado. Temos também o Sinal Vermelho, uma campanha que levou o DF a ser a primeira unidade da federação a criar o programa Sinal Vermelho, e a partir dele estamos capacitando profissionais de estabelecimentos comerciais, do Parque da Cidade, do Sesc, entre outros, mostrando a importância de a sociedade abraçar essa causa.