10/02/2015 às 18:00

Literatura ajuda internos a ingressar na faculdade

Projeto Arte do Saber começou em Santa Maria há um ano e será ampliado. Livros são cobiçados por jovens em conflito com a lei, e vidas ganham outro rumo

Por Mariana Damaceno, da Agência Brasília


. Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília

Atualizado em 10 de fevereiro de 2015, às 19h13

A Secretaria de Políticas para Crianças, Adolescentes e Juventude vai ampliar o projeto Arte do Saber, em funcionamento desde abril de 2014, na Unidade de Internação de Santa Maria. A ideia, segundo a pasta, é que sejam inauguradas bibliotecas em outras seis unidades de internação do DF em 2 de abril — Dia Internacional do Livro Infantojuvenil.

Para viabilizar a ampliação, a secretaria começa a se reunir com iniciativas privadas e com a Vara da Infância e da Juventude do DF nesta semana. Também está prevista uma campanha de doação de livros para as unidades, com início em 21 de fevereiro.

Atração por histórias
O projeto foi criado como oportunidade de entretenimento para os 165 adolescentes da Unidade de Internação de Santa Maria. Existe apenas um aparelho de televisão, em uma sala de convivência, onde os internos permanecem em horários estabelecidos. “O projeto surgiu para uma ressocialização de verdade”, resumiu a secretária da pasta, Jane Klébia Reis. “Hoje, os adolescentes de Santa Maria pedem pelos livros e se interessam por esse universo.”

A iniciativa reúne cerca de 1,5 mil exemplares, catalogados pelo estilo literário e pela complexidade. A maior parte fica na biblioteca. No entanto, diariamente, o responsável pela parte operacional do projeto, Abdallah Antun, percorre orgulhoso os corredores com um carrinho, à cata de entregas e devoluções. “Eu procuro esquecer o que cada um fez lá fora”, afirma. “Quando passo, eles ficam gritando meu nome, pedindo livro. É uma festa”, alegra-se ele, que trabalha desde 2006 no sistema socioeducativo.

Cadastro
Para participar da Arte do Saber, os interessados fazem um cadastro, que serve de controle para Antun sobre conservação das obras e assiduidade. Os adolescentes devem também entregar uma redação sobre o que leram. O texto é anexado ao processo dos internos e ainda lhes rende alguns benefícios, como ligação telefônica para a família.

Antun lembra que a quantidade de adeptos — no início, atingia 70% — hoje equivale a 90% dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa na unidade, ou seja, 165 jovens em conflito com a lei leem até três livros por semana.

Volta por cima
Bruna (nome fictício) tem 18 anos e cumpre medida socioeducativa desde 2013 na instituição, onde concluiu o ensino médio. Com o auxílio da Arte do Saber, passou no Enem, foi aprovada no Programa Universidade para Todos (Prouni) para educação física, e agora espera autorização da Vara da Infância e Juventude do DF para frequentar as aulas. “Para mim, era coisa de louco ler livros dessa grossura, mas, hoje, eu gosto muito.”

Caso semelhante vive Flávia, também de 18 anos. Ela foi a adolescente que mais devorou exemplares no primeiro mês do projeto em abril de 2014: cerca de 20 obras. Ela também foi aprovada no Prouni, para o curso de administração.