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05/10/2017 às 09:06, atualizado em 05/10/2017 às 11:38
Recém-instalado em São Sebastião, Alessandro Werner Ramos integra o grupo de 30 famílias que receberão aluguel e assistência social por meio de parceria entre os Executivos local e federal e entidades não governamentais
A cama de solteiro acomodada no canto da sala é bem diferente do caixote improvisado no chão em um beco do Setor Comercial Sul. Mais inusitada ainda é a tranquilidade ao recostar a cabeça no travesseiro e poder permanecer assim por toda a madrugada: sem medo.
“Na rua, me mantinha acordado a noite toda e dormia de dia, para evitar ser enxotado, roubado ou agredido”, lembra Alessandro Werner Ramos sobre os perigos aos quais foi submetido por quase cinco anos, tempo que passou em situação de rua.
Em outubro, o brasiliense de 41 anos comemora um mês desde que recebeu as chaves do apartamento onde vive em São Sebastião. “Agora tento manter a rotina de acordar cedo, aproveito a privacidade, tomo banho quente, posso fazer a comida de que gosto”, conta, para detalhar o dia a dia no imóvel de um cômodo alugado na Quadra 12 do Bairro São José.
A moradia é custeada pelo programa Cuidando da Vida, parceria entre o governo de Brasília e entidades não governamentais, com recursos do Ministério da Justiça.
A iniciativa tem como objetivo reverter a situação de vulnerabilidade e dar oportunidades à população de rua por meio de aluguel, ações de saúde, trabalho, educação e cultura.
[Olho texto='”Ninguém sai da rua e imediatamente se cura de tudo, deixa o passado para trás. Retomar outra rotina é um desafio diário”‘ assinatura=”Alessandro Werner Ramos, que passou cinco anos em situação de rua” esquerda_direita_centro=”esquerda”]
Depois de abraçar a chance, Alessandro agora luta para vencer o desemprego e o preconceito. “Ninguém sai da rua e imediatamente se cura de tudo, deixa o passado para trás. Retomar outra rotina é um desafio diário”, constata o morador de São Sebastião, que sonha em ter uma bicicleta para se locomover pelas redondezas.
Alessandro passou parte da infância com a avó, na Asa Sul, e parte da adolescência em Samambaia e em Valparaíso (GO), município do Entorno. A dependência química e os conflitos familiares fizeram com que a rua se tornasse sua habitação.
Antes, ele já havia trabalhado com serviços gerais, no comércio, com sistema de segurança de banco e serviu no Exército. No centro do Plano Piloto, foi lavador de carros de dia e vigia dos automóveis à noite. Lá também, recebeu a ajuda que mudou sua trajetória.
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Incentivado por produtores culturais que atuam na região, Alessandro foi apresentado à equipe do Cuidando da Vida, apoio, segundo ele, fundamental para mantê-lo afastado das drogas e com vontade de mudar.
“Eles me deram todo o estímulo para continuar, me trataram de igual para igual, sem distinção pelo o que uso ou como me visto. São poucos que nos veem assim”, opina.
Assim que se mudou para a casa, os amigos produtores e artistas do Setor Comercial Sul presentearam-no com ajuda de custo para comprar a mobília e mantimentos.
Nos tempos de rua, ele já tinha tentado participar de projetos de igrejas e passou por clínicas de reabilitação para dependentes químicos, mas sem sucesso. “Estava sem esperança, mas abracei essa oportunidade e sei que tudo vai melhorar!”
Ciente de que o aluguel é só o começo, Alessandro confirma que o objetivo agora é manter as contas em dia e a casa limpa, fazer um curso profissionalizante e conseguir um emprego. “Também quero fazer um almoço para receber meus três filhos, meu neto e minha mãe no fim de semana”, planeja.
Alessandro foi o oitavo entre as dez pessoas que já se instalaram em casas alugadas por meio do Cuidando da Vida. Os beneficiários estão distribuídos em São Sebastião, em Taguatinga, em Samambaia, em Sobradinho e no Paranoá. Outros 20 serão encaminhados nos próximos meses para outros imóveis.
A iniciativa é oriunda de convênio de R$ 1,002 milhão com a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, do Ministério da Justiça, e uma parceria do governo de Brasília, por meio da Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, com a revista Traços e com a Associação Cultural Namastê, entidade executora do projeto e responsável por firmar os contratos.
“Nós cuidamos da documentação e escolhemos o imóvel, que tem custo médio de R$ 600 mensais, levando em conta a necessidade da família”, explica a presidente da Associação Cultural Namastê, Luciana Vitor.
Quatro equipes, com três profissionais — que variam entre psicólogos, assistentes sociais, educadores e facilitadores sociais —, trabalham diretamente com quem recebe o benefício.
Para manter o direito ao aluguel, os selecionados pelo programa-piloto têm de se comprometer a ser responsáveis com a casa, o que é fiscalizado pelas equipes semanalmente.
“Eles devem cumprir requisitos como cuidado com a higiene e respeitar as regras de convivência”, reforça Luciana.
As equipes também são responsáveis por levar as demandas dos assistidos à Namastê e encaminhá-las ao Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop) do Plano Piloto, vinculado à Secretaria do Trabalho e aos Centros de Atenção Psicossocial, do Ministério da Saúde.
[Olho texto=”Além da moradia, por meio do aluguel de um espaço, o Cuidando da Vida trabalha nos eixos de cultura, esporte e no psicossocial, respeitando a aptidão e a liberdade de cada um” assinatura=”” esquerda_direita_centro=”direita”]
Como forma de incluir os beneficiados nos programas habitacionais do governo, todos são encaminhados para fazer o cadastro na Companhia de Desenvolvimento Habitacional do DF (Codhab).
“Além da moradia, por meio do aluguel de um espaço, trabalhamos nos eixos de cultura, esporte e no psicossocial, respeitando a aptidão e a liberdade de cada um deles”, reforça Luciana.
Ainda neste semestre, a associação abrirá um centro de convivência no Setor Comercial Sul, onde serão ministradas oficinas de teatro, dança, música e outras atividades culturais.
Nos próximos meses, começará a oferta de modalidades esportivas. Na área de criação de renda, a maioria é convidada a trabalhar na venda da revista Traços.
“O que esperamos, ao final desse período, é que eles estejam aptos a se manter sozinhos e conquistem outras oportunidades”, conclui a presidente da entidade gestora do projeto.
Edição: Raquel Flores