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27/06/2019 às 10:15, atualizado em 19/07/2019 às 16:05
Concepção do cartão-postal antecipa a construção de Brasília. O primeiro a perceber o potencial hídrico que alimentava o Planalto Central foi o botânico francês Auguste François Marie Glaziou, no século XIX
Um dos principais cartões postais de Brasília nasceu antes mesmo da capital. Seis décadas antes, na verdade. Chamado de “moldura líquida da cidade” por Juscelino Kubitschek, a ideia de se ter um lago onde hoje existe o Lago Paranoá foi pensada bem antes da eleição do presidente que tirou Brasília do papel e da decisão definitiva de se transferir a capital para o Planalto Central.
Foi o botânico francês Auguste François Marie Glaziou o primeiro a perceber o potencial hídrico que alimentava o rio Paranoá. Ele foi um dos integrantes da Comissão Cruls, que visitou a região entre 1892 e 1894. Em seu artigo “Notícia sobre Botânica Aplicada”, presente no relatório parcial da Comissão de Estudos da Nova Capital da União, publicado em 1896 no Rio de Janeiro, Glaziou descreve o relevo da região e aponta as facilidades que a depressão provocada pelo Rio Paranoá e os pequenos rios ao seu redor davam à construção de um lago artificial.
“Ele observou o vale formado por um processo de milhões de anos: a erosão causada pelas águas dos rios que passavam ali e desaguavam no rio São Bartolomeu”, afirma Elias Manoel da Silva, historiador do Arquivo Público do DF. “Ele disse que, se represasse a água no local onde ficavam as cachoeiras do Paranoá, era fácil fazer um lago. Bastava fechar o Paranoá”, completa.
Em seu relatório, Glaziou comenta que chegou “a um vastíssimo vale banhado pelos rios Torto, Gama, Vicente Pires, Riacho Fundo, Bananal e outros. Impressionou-me muitíssimo a calma severa e majestosa desse vale. […] Entre dois grandes chapadões na localidade pelos nomes de Gama e Paranoá, existe imensa planície em parte sujeita a ser coberta pelas águas da estação chuvosa”. E diz:
[Olho texto=”É fácil compreender que, fechando essa brecha, com uma obra de arte, forçosamente a água tornará ao seu lugar primitivo e formará um lago navegável em todos os sentidos” assinatura=”Auguste François Marie Glaziou” esquerda_direita_centro=”centro”]
A arquiteta Angelina Nardelli Quaglia acrescenta que o botânico francês também referenciava um futuro lago como elemento de “aformoseamento para a região, trazendo a admiração de todas as nações”. “O espelho d’água esteve presente desde o início como um importante elemento da topografia a ser inserido ao cotidiano da cidade”, afirma.
Depois das duas comissões presididas por Luiz Cruls ainda no século 19, várias comissões foram criadas para estudar a mudança da capital até 1955, quando JK foi eleito e começou de fato a transferência. Todas elas se reportavam às conclusões da Missão Cruls até que, em 1955, um projeto urbanístico da nova capital – elaborado a pedido do marechal José Pessoa, presidente da Comissão de Localização da Nova Capital do Brasil, chamado Vera Cruz –, traz o desenho de um lago. “O lago era pequeno, não tinha as dimensões do de hoje. Era apenas a representação de que a capital teria um lago”, explica Elias Manoel.
A certidão de nascimento do Lago Paranoá, no entanto, é do dia 30 de setembro de 1956, o dia da publicação do edital do concurso do Plano Piloto. A criação de um lago era exigência que todos os concorrentes deveriam levar em conta. Assim, todos os 26 projetos apresentados tinham no limite leste a presença de um lago cujo nível das águas era a cota 1.000, ou seja, a superfície do lago ficaria a mil metros acima do nível do mar.
Faziam parte da comissão que preparou o edital do concurso, os arquitetos Raul Penna Firme e Roberto Lacombe, os mesmos que tinham pela primeira vez criado o projeto Vera Cruz com a presença do lago artificial. “É bem provável que esses arquitetos conhecessem as sugestões apresentadas no relatório do botânico Glaziou”, diz o historiador do Arquivo Público.
A presença do lago então é justificada como fator estético e de lazer. Sua construção foi idealizada para aumentar a umidade do ar, diminuir a temperatura local e estabelecer uma fonte de lazer aos brasilienses. A construção da barragem no rio Paranoá começou em 1957 e as obras ficaram a cargo da empresa americana Raymond Concrete Pile Company of the Americas, a mesma que havia vencido a concorrência para entregar as estruturas metálicas dos edifícios da Esplanada dos Ministérios e única empresa estrangeira que trabalhava na construção da capital.
Num contexto em que as obras se guiavam pelo “ritmo de Brasília”, onde, em qualquer dificuldade, criava-se uma solução de emergência, o estilo de trabalho da empresa americana provocava atrasos constantes nas obras de construção da barragem. Juscelino, insatisfeito com o ritmo das obras, rescindiu o contrato e transferiu a responsabilidade pela construção da barragem para a Novacap, que dividiu o trabalho entre as construtoras Camargo Corrêa, Rabello e Engenharia Civil e Portuária. “A firma só sabia trabalhar segundo os métodos e os cronogramas norte-americanos”, dizia o presidente.
Para ele, era inconcebível a inauguração de Brasília sem o lago. “Como inaugurar Brasília sem o lago tão amplamente anunciado e que, além do mais, seria a moldura líquida da cidade?”, questionava. Operários que trabalharam na construção da barragem relatam que as comportas foram fechadas sem a represa estar pronta.
Apesar dos contratempos, a barragem foi fechada em 12 de setembro de 1959, dia do aniversário de JK. Segundo o historiador Jarbas Silva Marques, a água subia cerca de dois centímetros por dia e, na inauguração de Brasília, o lago estava completamente formado.
No local havia um acampamento, a Vila Amaury, onde se abrigavam aproximadamente 16 mil operários da construção. Muitos não acreditavam que o local seria alagado, mas tiveram que sair às pressas quando a água chegou, mais rápido do que imaginavam os especialistas. A Vila Amaury naufragou e hoje suas ruínas podem ser vistas no fundo do lago.
O livro “1001 coisas que aconteceram em Brasília e você não sabia”, escrito pelo jornalista Hélio Queiroz, reúne mais de 700 relatos de fatos que aconteceram antes, durante e depois da construção de Brasília. Nele, pioneiros relatam que ”as águas do lago foram subindo e os moradores da Vila Amaury se mudando”. Até fins de 1959, mais de 100 famílias haviam se transferido. As transferências prosseguiram até o começo de 1960, quando as águas do lago cobriram toda a vila.
O argumento de que o lago não iria encher porque as terras do Planalto Central eram porosas foi muito usado pelos opositores a Juscelino e contrários à transferência da capital e à construção de Brasília. Os boatos tinham dois autores principais: o presidente do Clube de Engenharia, Maurício Joppert da Silva, e o escritor Gustavo Corção. “A água do lago poderá ser absorvida pelo terreno, deixando-o vazio, total ou parcialmente”, escreveu Corção em um longo artigo no Jornal do Brasil em julho de 1959. Quando a barragem foi inaugurada e o lago começou a encher, JK mandou um lacônico telegrama a Corção dizendo “Encheu, viu!”