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10/10/2019 às 09:56, atualizado em 15/10/2019 às 19:11
Grupo de amigos que cresceram juntos na 312 Norte lembra como era bom ser criança no final das décadas de 1960 e 1970. Quadra foi a primeira inaugurada com estrutura completa
Eles cresceram com Brasília. Chegaram à capital em 1966 com a transferência dos pais, funcionários públicos. Tinham 4, 5, 6 anos. Foram morar na mesma quadra, a 312 Norte, e conviveram diariamente até a adolescência, em meados dos anos 80. Faziam tudo juntos. Iam à mesma escola, que ficava dentro da quadra, corriam entre os blocos brincando de pique-pega, jogavam bola, faziam trilhas e exploravam o Cerrado praticamente virgem perto de casa. Guardam, assim, lembranças de uma infância livre e muito divertida.
“A gente só ia em casa para almoçar e jantar. Quando não estávamos na escola, estávamos brincando embaixo do bloco”, resume o bancário Ernesto Morais, o Nesto, hoje com 55 anos.
Os vizinhos da primeira superquadra da Asa Norte a ser inaugurada completa, com todos os blocos (são 11 no total) e equipamentos públicos, tornaram-se amigos e colecionam memórias de momentos vividos lado a lado ao longo de uma vida. Um grupo de cerca de 50 pessoas com, em média, 55 anos, é amigo até hoje.
Eles se encontram toda sexta-feira à noite em um bar na comercial da 312. Eles cresceram, casaram-se, tiveram filhos e alguns ainda moram ali. “Éramos muito colados”, diz o assistente administrativo Ismael Teles, 58 anos, que participava das brincadeiras, mas tinha que obedecer a regras. “Meu pai era mais severo. Eu tinha hora para brincar, mas também tinha que estudar”, lembra.
Apesar de alguns blocos já terem sido construídos, àquela época, em outras quadras da Asa Norte, a 312 foi a primeira a ficar completa na parte norte da capital. Inaugurada em junho de 1966, ela foi ocupada basicamente por funcionários públicos transferidos principalmente do Ceará e do Rio de Janeiro. Em uma época na qual a região era muito mais uma extensão de terra vermelha do que um bairro residencial, a quadra foi, por muito tempo, o local mais populoso de Brasília. Seus 864 apartamentos eram ocupados por famílias numerosas.
Na casa de Carlos Cézar Soares Batista – o Cecéu, hoje com 58 anos – por exemplo, eram seis: dois adultos (os pais) e quatro crianças. Ele tinha 5 anos quando chegou em Brasília em 1966, ano em que os pais vieram transferidos do Ceará. Eles trabalhavam no Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) em Fortaleza. Em Brasília tiveram o quinto filho, Danilo, nascido em 1981.
“Era muito menino. Às vezes eram oito, dez filhos e os primos praticamente moravam junto. Era tanta gente, que fazíamos campeonato de futebol por bloco. Montávamos os times por andar”, conta Cecéu, que morava no bloco D. Nesto morava no bloco I e Ismael no bloco K.
Os amigos brincavam na própria quadra, com brinquedos baratos e até improvisados. Diferentemente destes tempos atuais de tablets, smartphones, games e outras modernidades eletrônicas, eles soltavam pipa, jogavam bolinha de gude e futebol e brincavam de vários piques – pega, esconde, ladrão.
O material de construção também virava brinquedo: tábuas e ripas de madeira ora eram usadas em carrinhos de rolimã, ora viravam tacos de bete, uma versão simplificada do beisebol, quando o grupo é dividido em dois times: um começa com os tacos (rebatedores) e o outro com a bola (lançadores).
Tudo virava brincadeira para as crianças. A água da enxurrada formada quando chovia era represada por eles com areia e outros materiais usados em obras. A quadra foi entregue com asfalto, mas a área dos estacionamentos era livre e usada pela turma como campo de futebol ou de queimada.
“Nossa vida era dentro da quadra, que era nosso parque de diversões”, conta Cecéu. “Hoje a gente vem à quadra e nem vê criança”, lamenta.
Às vezes eles saíam da quadra e se aventuravam pelo Cerrado. Passavam horas dentro do mato para chegar à Água Mineral, a pé. Ou iam ao Lago Paranoá, onde aproveitavam para pescar e se refrescar no calor da seca do Planalto Central.
“Aqui em volta era tudo mato, não tinha nada. Tinha uma mina onde é a 311 Norte, a coisa mais bonita, a gente brincava na água”, recorda-se o radialista Roberto Lopes, 56 anos, que tinha o irmão Robson, seis anos mais novo, como grande companheiro de aventura. “Ele tem o cabelo branco desde aquela época”, brincam os amigos.
Os irmãos cresceram e se casaram, mas continuam morando no mesmo bloco D da SQN 312, cada um em um apartamento com sua família.
A turma da 312 também frequentou ícones da infância brasiliense, como o Parque Ana Lídia, inaugurado quando eles tinham cerca de 10 anos, e a Piscina de Ondas, que abriu as portas sete anos depois. O Parque da Cidade, no entanto, ficava longe demais do final da Asa Norte. “Tudo era muito longe. Não era como hoje que todo mundo tem carro. Brincar mesmo era aqui na quadra ou perto dela”, conta Cecéu.
A turma cresceu e surgiu a segunda geração de amigos da 312 Norte. Em 1982, um morador da quadra, que era funcionário da Secretaria de Esportes e Lazer, muito querido pelas crianças, organizou a Mirinzada, um evento esportivo que movimentou a meninada. Nem quadra de esportes existia e as competições aconteceram no asfalto mesmo, nos estacionamentos entre os blocos.
Eduardo Teles, 50 anos, é o irmão caçula de Ismael. Ele tinha 12 ou 13 anos e participou do time de vôlei, mas os “atletas” da quadra montaram também times de atletismo, futebol e basquete. Os mais velhos foram técnicos dos times das crianças. Ismael treinou o time apelidado de “Muralha Vermelha”.
Eduardo não sabe dizer se apenas os moradores da 312 participaram da Mirinzada ou se o evento foi aberto a outras quadras. Ele só se lembra de que cada equipe vestia uma camiseta de cor diferente – a dele era azul marinho, mas também havia camisetas vermelhas, amarelas e pretas. Recorda também de que as competições reuniam centenas de crianças.
“Não me lembro direito, era muito novo. Mas foi um evento que reuniu os moradores de todos os blocos. A 312 era como uma comunidade, todo mundo se conhecia. Não tinha nada em volta”, diz.
Por ter, entre os moradores, um grande número de estudantes e professores da Universidade de Brasília (UnB), a 312 Norte logo se tornou um importante ponto cultural da cidade. Foi lá que surgiu, nos anos 1980, o Panelão da Arte (“Para acabar com as panelinhas!”), com a apresentação regular de vários artistas ao ar livre na quadra.
Naquela época, a turma, que ainda andava junta, chegou à adolescência. Consequentemente, as brincadeiras embaixo do bloco deram lugar às festinhas, que aconteciam nas salas dos apartamentos; às matinês ao som das bandas brasilienses Aborto Elétrico e Plebe Rude; e aos bailes de carnaval no Minas Tênis Clube, a poucos quilômetros dali.
Os clubes do Bolinha e da Luluzinha se misturaram e produziram até alguns casamentos a partir dos namoricos da turma. Cecéu era o galã, enquanto todos os meninos queriam namorar as três irmãs dele. Ele não nega a fama de namorador, mas justifica.
“Eu fazia sucesso porque tinha uma mobilete”, diz o hoje servidor público, casado há 32 anos com Cláudia Volpi, 53 anos, que ele conheceu no trabalho.
As redes sociais permitem o convívio dos amigos de infância na vida adulta depois dos casamentos e filhos. Eles mantêm um grupo no Facebook que tem 478 membros – umas cinco gerações de moradores da quadra. Lá postam fotos antigas, além de registros das ocasiões em que se encontram e matam um pouco da saudade do passado.
Anualmente, grande parte deles se encontra no aniversário da quadra, que fez 53 anos em junho. Na data, moradores e ex-moradores se organizam e armam uma grande festa no gramado que divide a quadra com a vizinha 311. É uma reunião de milhares de pessoas.
Alguns já não moram em Brasília. Fabíola Parente Ramalho, 56 anos, aproveita as redes sociais para manter contato com os amigos que ficaram na capital. Ela viveu durante três décadas na quadra, mas desde 1997 mora fora, em Volta Redonda (RJ). “Pela internet conseguimos estar sempre presentes na vida uns dos outros”, diz.
“Aquela época foi tudo de bom. Tivemos uma infância muito feliz e saudável. Eu era muito moleca, estava o tempo todo embaixo do bloco, brincando com os meninos no pilotis”, acrescenta.