21/10/2019 às 11:20, atualizado em 21/10/2019 às 11:42

Em 40 anos, o DF terá mais idosos do que jovens? O que fazer?

Fenômeno vai exigir novas políticas públicas em diferentes áreas, como saúde, transporte e mobilidade urbana. Gestores mostram o que é necessário

Por Gizella Rodrigues, da Agência Brasília

Desafio é o que move pessoas, instituições e governos. Mas há um especialmente instigante para o Governo do Distrito Federal até 2060, quando a capital completa 100 anos: o envelhecimento da população. Hoje, 44% de quem vive no DF tem entre 30 e 59 anos. E apenas 10,5% da população tem mais de 60 anos. Em 40 anos, no entanto, as duas faixas etárias vão se aproximar – o que vai exigir a formulação de novas políticas públicas em diferentes áreas, como saúde, transporte, mobilidade urbana e social (confira gráfico abaixo).

Arte: Édipo Torres/Agência Brasília

Em 2060, o percentual de idosos vai chegar a quase 33% da população, de acordo com projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por outro lado, a quantidade de adultos entre 30 e 59 anos vai cair para 38%. Mais grave: o percentual de maiores de 60 anos vai ultrapassar o de crianças e jovens entre 0 e 19 anos (17,4%), que hoje representam 30% da população. Isso vai exigir uma mudança estrutural e profunda no padrão de demanda por serviços.

O Plano Estratégico do Distrito Federal 2019/2060 (PEDF), norteador das ações do GDF para que a capital chegue ao seu centenário atendendo as demandas atuais da população – e, também, as necessidades das gerações futuras -, considera o envelhecimento da população uma grande preocupação para a atuação eficiente do Estado. Três eixos tratam de iniciativas relacionadas à pessoa idosa (saúde, desenvolvimento social e territorial) e várias ações estão previstas para serem implementadas até 2060.

Na saúde pública, está prevista a ampliação dos serviços ofertados pelas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), com a infraestrutura adequada de pessoal e equipamentos (desfibrilador, ultrassom obstétrico e eletrocardiógrafo) e uma maior cobertura da estratégia de saúde da família, Também será aumento o número de unidades e de equipes em Planaltina; Recanto das Emas; Samambaia; Vicente Pires; Águas Claras; Plano Piloto; lagos Sul e Norte; Fercal; Ceilândia; Paranoá; Jardim Mangueiral; Sobradinho; Santa Maria e Estrutural.

No eixo Desenvolvimento Social, o plano é construir e equipar seis casas dos idosos no DF para a população de baixa renda. Quanto à mobilidade, o PEDF estabelece a implementação de acessibilidade nas 24 estações de Metrô atualmente operantes – e  a implantação de oito novas estações. Para o uso de espaço e equipamentos públicos, o Plano previu a manutenção e acesso de diversos equipamentos culturais, como o Teatro Nacional, o Museu de Arte de Brasília e a revitalização da W3 Sul.

Idosos no DF
Atualmente, o DF tem 303.017 pessoas com 60 anos ou mais, segundo análise da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), sobre a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD) de 2018. Os dados mostram que 57,9% da população idosa é do sexo feminino – mas esse percentual aumenta com o avanço da idade, já que a expectativa de vida feminina é sete anos maior que a masculina. Entre a população acima de 80 anos, por exemplo, apenas 37,2% é de homens, enquanto as mulheres representam 62,8%. 

Arte: Édipo Torres/Agência Brasília

As Regiões Administrativas (RAs) com a maior quantidade de idosos, em números absolutos, são Ceilândia (42.869), Plano Piloto (39.157) e Taguatinga (31.483). Quase 40% da população idosa do Distrito Federal vive nessas cidades. Mas as duas regiões onde a proporção de idosos em relação ao total da população é maior são os lagos Sul e Lago Norte, onde o percentual de idosos chega, respectivamente, a 23,8% e 21,2% dos moradores.

Para a chefe do Núcleo de Estudos Populacionais da Codeplan, Mônica França, a combinação da elevada esperança de vida com a redução na taxa de fecundidade resultou no envelhecimento progressivo do indivíduo e aumento da participação desta faixa etária no total da população. 

Ela ressalta que o crescimento do número de idosos no DF é mais rápido que o de outros estados – cresceu quase meio percentual de 2018 para 2019 por exemplo. “A crescente participação do idoso na população assim como na força de trabalho vai exigir a formulação de novas políticas públicas em diferentes áreas, como previdência social, saúde, mobilidade, transporte, estrutura pública e até cultura”, afirma. “O Estado vai precisar parar de se ocupar com a demanda por creches ou UTI neonatal, por exemplo, para se preocupar com a oferta de UTI geriátrica”, exemplifica.

Mônica ressalta que os demógrafos dão importância a três agrupamentos populacionais, as crianças (0 a 14 anos); jovens e adultos (15 a 59 anos) e os idosos (60 anos ou mais). Considerando esses três grupos, a razão de dependência da população do DF hoje, onde 69% tem entre 15 e 59 anos, é de 100 pessoas economicamente ativas para cada 45 dependentes (0 a 14 anos ou acima de 60 anos). 

Foto: Acácio Pinheiro/Agência Brasília

Em 2060, essa razão será de 100 para 83. “Isso quer dizer que 100 pessoas vão precisar trabalhar para manter 83 economicamente dependentes –  os idosos e as crianças”, explica. “Hoje temos mais gente trabalhando do que sem trabalhar. Em 2060 será quase meio a meio. Isso é grave”, completa. 

Políticas públicas
O Distrito Federal tinha uma Secretaria do Idoso, que funcionou até 2014, mas, na gestão passada, foi transformada em uma coordenação vinculada à então Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos (Sedest). O governador Ibaneis Rocha, quando assumiu o GDF, criou uma subsecretaria do idoso, vinculada à Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus). 

“O envelhecimento é uma característica humana. Sua proteção é um direito social. Dessa forma, é obrigação da sociedade, de modo geral, garantir a efetivação desse direito de forma digna. Mas também é uma obrigação do Estado a efetivação de políticas que contribuam para a garantia de direitos aos idosos”, afirma o secretário de Justiça e Cidadania, Gustavo Rocha.

O subsecretário de Políticas para o Idoso, Washington Mesquita, explica que o papel da Subidoso é levar o pleito da população com mais de 60 anos ao governo, acompanhar investimentos e contribuir para a elaboração de políticas públicas – e sempre em parcerias com outras pastas. 

“Estamos retomando um trabalho que ficou praticamente paralisado durante quatro anos”, afirma. “Somos a voz do idoso, queremos fazer a gestão das políticas públicas para eles. Nossa meta é tornar Brasília uma referência no envelhecimento ativo e saudável”, acrescenta.

Programa Viver
Em 10 meses de governo, a primeira grande ação da Subidoso foi o lançamento do Programa Viver – Envelhecimento Ativo e Saudável do DF, que prevê a promoção de ações conjuntas nas áreas de educação, atendimento jurídico e direitos humanos/cidadania, com vistas à promoção do envelhecimento ativo, à melhoria da qualidade de vida, à conscientização sobre os direitos da pessoa idosa e à valorização dessa população no Distrito Federal.  

Como parte das ações, foi inaugurado, em julho, no Centro de Convivência do Idoso do Recanto das Emas, um centro de inclusão digital específico para o atendimento dos maiores de 60 anos. O local oferece, gratuitamente, cursos de informática básica, navegação de internet e redes sociais para a inclusão digital e social de pessoas nessa faixa etária. 

Outros quatro centros de inclusão digital estão em funcionamento no DF e atendem todas as faixas etárias da população, inclusive idosos. A meta é ter um em cada região administrativa. “Mais do que inclusão digital, estamos fazendo inclusão social. A gente tira ele da ociosidade – e do abandono, muitas vezes – faz uma interação comunitária. Tem idoso que nunca ligou o computador ou nunca acessou a internet”, ressalta Mesquita.

Impactos na saúde
O subsecretário de Políticas para o Idoso, porém, reconhece que o maior impacto do envelhecimento da população será na saúde. Com um maior número de idosos, sabe-se o que o Estado deverá lidar com o: aumento das doenças crônicas não transmissíveis e maior procura dos serviços de saúde para tratamento das doenças crônico-degenerativas, que acometem, principalmente, os maiores de 60 anos.

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Um estudo do Ministério da Saúde, divulgado em outubro do ano passado, mostrou que 75,3% dos idosos brasileiros dependem exclusivamente dos serviços prestados no Sistema Único de Saúde – sendo que 83,1% realizaram pelo menos uma consulta médica nos últimos 12 meses. 

Nesse período, foi identificado ainda que 10,2% dos idosos foram hospitalizados uma ou mais vezes. Quase 40% dos maiores de 60 anos possuem uma doença crônica e 29,8% possuem duas ou mais delas, como diabetes, hipertensão ou artrite. Ao todo, 70% dos idosos possuem doenças crônicas.

Vida financeira
No DF, a população idosa possui uma renda média de R$ 3.938, segundo a Codeplan, e 46,4% em média possuem plano de saúde – sendo que a maioria (56,9%) está na faixa etária de 80 anos ou mais. No entanto, há uma desigualdade entre as RAs. Enquanto 87,9% dos idosos nas regiões de maior renda pagam um convênio particular, apenas 13,7% deles têm plano nas RAs de menor renda. 

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Washington Mesquita, da Subidoso, afirma que um termo de cooperação com a Secretaria de Saúde será assinado em breve – para garantir o melhor atendimento aos idosos nas UBSs, nas UPAs e hospitais. Com isso, uma equipe do programa saúde da família prestaria atendimento uma vez por semana nos Centros de Convivência de Idosos – existem 14 no DF. Ele também diz que o GDF quer criar seis “casas-dia do idoso”, um local para os maiores de 60 anos fazem oficinas diversas. 

Clínica móvel
Além disso, foi incluído no Plano Plurianual do GDF para o período 2020 a 2023, que foi encaminhado para a Câmara Legislativa, a previsão orçamentária para implementar a Clínica Móvel de Saúde da Pessoa Idosa, uma carreta equipada com três consultórios:

  1. uma clínica médica para atendimento preventivo e correto encaminhamento da idoso a uma unidade da saúde pública
  2. uma clínica oftalmológica com a proposta de, além de fazer consultas, dar a receita de óculos e diagnosticar catarata, oferecer armações e lentes gratuitas para pessoas de baixa renda 
  3. uma terceira com um otorrino

[Olho texto=”A carreta teria um investimento de apenas R$ 100 por paciente” assinatura=”Washington Mesquita, subsecretário de Políticas para o Idoso” esquerda_direita_centro=”esquerda”]

A ideia é que a carreta percorra todo o DF e passe uma semana estacionada em cada RA. O custo seria de R$ 3 milhões por ano e a previsão é atender 30 mil pessoas por ano. 

A clínica móvel seria uma forma de levar a máquina pública até as pessoas. “Um idoso que mora no Sol Nascente, por exemplo, não teria que ir para a Ceilândia até o hospital, o médico estaria na porta dele”, diz Mesquita.

Cuidados
Maria Francisca de Jesus Oliveira, 69 anos, tem diabetes, hipertensão, problemas cardíacos e artrite. Até dois meses atrás, ela só saía de casa com o auxílio de uma bengala que aliviava a dor na coluna e lhe dava mais equilíbrio. Mas, depois que começou a frequentar o grupo Vida e Saúde e participar das atividades oferecidas na Unidade Básica de Saúde (UBS) 6, de Ceilândia Sul, sua qualidade de vida melhorou. “Eu só andava com a bengala. Agora faço os exercícios sem ela”, diz. “Minha glicose está controlada, já perdi peso. Não fico mais sem vir”, conta.

Maria Francisca: da bengala aos exercícios livres – Foto: Acácio Pinheiro/Agência Brasília

Todos os dias, de segunda a sexta-feira, um grupo de idosos se reúne embaixo de uma tenda no estacionamento da UBS 6 às 7h30. Faça chuva ou faça sol eles estão lá, só faltam quando estão doentes. No local, funcionários do posto de saúde e voluntários da comunidade comandam aulas de treinamento funcional, alongamento, automassagem, forró, zumba, terapia ocupacional e fisioterapia. Às 9h, um grupo e 10 idosos participa de um circuito de prevenção de quedas, dado por funcionários da UBS.

A terapeuta ocupacional Polyana Gonçalves de Sousa, responsável pelas atividades, afirma que, mais importante que o exercício físico, é a socialização que os encontros proporcionam. “Aqui eles fazem amigos, saem de casa, não entram em depressão. Eles passeiam juntos e até viajam em grupo”, diz. Maria Alice dos Santos Souza, 68 anos, é prova disso.

Ela frequenta o grupo há mais de um ano e não economiza nas histórias e gargalhadas. “A gente cuida da saúde, mas é uma diversão só. Saio daqui livre, leve e solta”, dizia, sorridente, enquanto era questionada se iria ao passeio na Água Mineral na próxima sexta-feira. De acordo com a Secretaria de Saúde, todas as UBS têm cuidados para idosos.