11/12/2019 às 09:33

Cinema ajuda a tratar pessoas com transtorno mental

Frequentadores do Caps do Paranoá são as estrelas. No filme Os Capsianos, por exemplo, gente com poderes especiais que ensina aos humanos lições sobre sensibilidade

Por Agência Brasília *

Cinema, teatro e saúde mental: essa combinação tem ajudado pessoas com transtornos mentais a superar as barreiras pessoais e a aceitar melhor a própria condição. Prova disso é o trabalho do grupo Companhia Atravessa a Porta, formado por profissionais de saúde e voluntários do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) II do Paranoá.

Em oficinas semanais, projetos de arte e cultura são desenvolvidos pela trupe. O mais recente é a produção de um filme estrelado pelos frequentadores do Caps. Chamada de Os Capsianos, a película conta a história de pessoas com poderes especiais, que ensinam os seres humanos lições sobre sensibilidade.

Foto: Breno Esaki/Saúde-DF

Locais como a Praça dos Três Poderes, com sua arquitetura única, foram escolhidos para cenário do longa metragem, pois a trama retrata um futuro distópico (ruim, com anomalias, deformidades), onde a humanidade precisa reaprender sobre a importância dos sentimentos. 

Nesta realidade fictícia, os seres humanos vestem roupas de cor cinza para demonstrar a apatia vivida por eles. Por outro lado, os capsianos usam trajes coloridos e mobilizam a população com suas ideias, na “revolução da sensibilidade”.

A ideia do filme partiu dos próprios pacientes da unidade. Quem assume a autoria é Ana Cristina Anselmo, 45 anos, que interpreta um dos capsianos no longa. “Na brincadeira, eu dei esse apelido ao pessoal do Caps e a ideia de tratar sobre a sensibilidade. O mundo está sem amor ao próximo, com muitas pessoas egoístas. É um tema importante”, conta.

Preconceito
Para Ana Cristina, um dos focos do projeto é quebrar o preconceito sofrido pelas pessoas com transtorno mental. Este processo ela conhece bem – e tem se esforçado para superá-lo com o acompanhamento psicológico que faz desde 2005. Mas, nas suas palavras, só conseguiu “se firmar” na terapia depois que começou o trabalho de teatro e cinema no Caps do Paranoá.

“O projeto ajudou a me aceitar. Eu tinha preconceito comigo mesma, achando que só era falta do que fazer. Mas não é. Tenho síndrome do pânico e depressão, aspectos da síndrome de Borderline. Assim, parece que tenho muitas personalidades em uma só. São oscilações difíceis de suportar. Mas quando eu me aceito como sou, sei que estou caminhando para mudar”, avalia Ana Cristina.

Foto: Breno Esaki/Saúde-DF

Quem também aproveitou a experiência de estar em um filme foi Darlly Ferreira, 34 anos. Ela sofreu um surto psicótico quando era mais nova, mas encontrou na arte uma forma de superar suas questões.

“Estou achando mágico. Já tinha feito teatro e foi gratificante para mim. É bom ter o reconhecimento de alguma coisa que a gente está fazendo. Fora isso, você se sente útil, com forças para continuar”, comenta.

Potência terapêutica
Segundo Amanda Mota, psicóloga do Caps II do Paranoá, os trabalhos semanais da oficina viraram, com o tempo, a companhia Atravessa a Porta. “O intuito era pesquisar as linguagens cênicas e suas potências terapêuticas. E saber como a criação artística poderia ajudar a cada um deles”, lembra.

[Olho texto=”É uma forma de sonhar coletivamente, por meio da criação, da arte” assinatura=”Amanda Mota, psicóloga do Caps II do Paranoá” esquerda_direita_centro=”esquerda”]

Quem frequenta o serviço de saúde mental tem um olhar diferenciado. Isso traz aspectos novos para as ações culturais, diz a psicóloga. “Isso vai mudando sentimentos, dando espaço para que possam se expressar e se integrar. Às vezes, é uma forma de mandar um recado para o mundo e que não poderiam fazer de outro jeito”, pondera.

Foto: Breno Esaki/Saúde-DF

Atualmente, Os Capsianos é a sexta produção cinematográfica do grupo, entre curtas e longas, com previsão de concluir as gravações em 2020. Um outro filme deles será lançado ainda este ano, chamado Antônio sim, por que não, que conta a história da vida e da morte do personagem principal.

“Apresentamos os filmes no Caps, mas sempre tentamos levar para outros públicos. Já indicamos alguns para mostras na Universidade de Brasília e eventos de saúde mental. Este referente à história do seu Antônio é nosso primeiro longa e queremos fazer uma estreia pública. A ideia é buscar um espaço público de exibição, além da saúde mental”, informou Amanda Mota.

* Com informações da Secretaria de Saúde-DF