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15/04/2020 às 15:00, atualizado em 15/04/2020 às 15:46
Artista plástico e servidor público (quando não está pensando em arte), ele já pintou o céu, os monumentos, os ipês e até as placas de Brasília. Ah, e também a Brasília não tão óbvia
[Numeralha titulo_grande=”6″ texto=”dias para os 60 anos de Brasília” esquerda_direita_centro=”centro”]
Em homenagem à capital federal, formada por gente de todos os cantos, a Agência Brasília está publicando, diariamente, até 21 de abril, depoimentos de pessoas que declaram seu amor à cidade.
“Tinha um amigo meu, muito chato, que sempre me criticava. ‘Você só pinta Brasília’, ele dizia. Mas tem uma frase do escritor russo Liev Tolstói que sedimentou meu amor pela capital. ‘Quem pinta sua aldeia torna-se universal’. Depois de ouvir isso, perdi o receio de pintar Brasília. É a minha cidade e eu a amo. Estou começando a rodar o mundo com minha arte, mas quando eu volto é sempre aquele impacto: poxa, Brasília é incrível.
É impossível não pintar Brasília. Todos os pintores da cidade têm quadros maravilhosos sobre ela. O cara que não pinta Brasília não é artista de Brasília. Se você morasse em Londres ia pintar o Big Ben, o rio Tâmisa. E Brasília é tão distoante, com todo esse modernismo, que não tem como. É uma influência, me falta um termo melhor, quase parasitária, que se infiltra em você, te domina, é quase uma abdução. Você é abduzido por Brasília, não tem jeito.
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Quando eu comecei a pintar, há uns 10 anos, fiz muitos estudos em ikebana, que é uma arte floral, e que me deu vários conceitos que eu precisava, como equilíbrio, forma, contraste, cor. Quando aprendi esses conceitos, comecei a pintar o óbvio de Brasília, os monumentos, os ipês, o céu. Tanto que fiz uma série chamada ‘Óbvia Brasília’, a minha primeira, entre 2011 e 2012.
Depois dela eu fiz a série ‘Placas’. Eu vi, pela cidade, placas batidas, pichadas, fazendo parte da paisagem. Achei muita poesia no fato de nós interferirmos na paisagem (fazendo as placas) e depois interferir na interferência, seja com acidente de trânsito, com a pichação. Aí eu pintei as placas de Brasília com Brasília de fundo, ficou bem legal. Tanto que o embaixador da Bélgica na época, o Josef Smets, comprou uma tela e disse que nunca tinha visto, em lugar nenhum do mundo, uma placa avisando que as pessoas não buzinam, como tem aqui.
Depois dessa eu pintei uma série sobre como teria sido se o Van Gogh tivesse pintado Brasília. Eu comecei pintando Brasília, pintei 24 telas aqui, fiz ‘A Noite Estrelada’ no Palácio da Alvorada. Mas achei pouco e nós (o Van Gogh e eu) viajamos para o Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, Agreste e Sertão. Pintei mais de 90 telas com esse tema.
Eu não tenho tempo nem muita paciência pra fazer o plein air, aquela pintura ao ar livre. Como bom brasiliense, ando muito de carro. Quando eu vejo um cenário que acho que vai dar um bom quadro, eu paro, fotografo com a câmera do celular mesmo e depois pinto. Como a minha escola de arte é o expressionismo, eu pinto mais o que eu sinto do que vejo. Tenho a referência guardada e, quando vou para o ateliê, olho aquela foto, lembro do sentimento que tive quando vi aquela paisagem e faço a pintura.
O que mais me impressiona em Brasília é a cor. E a luz, também, que é fantástica. Você mistura os sentimentos que você tem com as linhas de Brasília. Aí, tem os ipês que são maravilhosos, o céu que é uma abstração diferente todos os dias, mesmo na época da seca que a gente fica monotemático com o céu. Ainda assim você consegue capturar nuances diferentes.
Eu tenho uma série que se chama ‘Céus’, que traz estudos sobre a dinâmica do céu de Brasília, ao mesmo tempo não desprezando os ipês, a escala monumental, mas sempre associados ao céu. Em primeiro plano, em 95% da imagem é o céu. Brasília é céu, natureza e modernismo.
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Quando eu era criança eu passava horas vendo o céu. Eu adorava, sabia todas as nuances dos tons do pôr-do-sol, dos dias de chuva. Quando chovia ficava cinza de um lado e sol no outro, um contraste maravilhoso, quando chovia muito longe, o céu ficava azul escuro, mas o pôr-do-sol, nas minhas costas, lançava uma luz amarela nesse azul. Um dia consegui pintar esse cenário que via na infância. Desde criança sempre tive a cabeça nas nuvens.
Sou nascido e criado em Brasília, meus pais vieram pra cá em 1968 para fazer a vida. Eles se formaram em um dia, casaram-se no outro e no seguinte já estavam em Brasília. Minha mãe é assistente social e meu pai, engenheiro. Ele chegou de manhã e de tarde tinha dois empregos. Eu nasci em 1973, sou o filho do meio de três irmãos. Fui criado na Asa Norte, numa época em que você andava de dia ou à noite sem nenhum problema. Hoje até anda, mas não pode dar mole. Eu morava em apartamento, mas meu quintal era a quadra. Era uma delícia. Fiz UnB e Ceub e sou servidor público nas minhas 40 horas vagas semanais, quando não estou pensando em arte.”
Rodrigo Nardotto, 47 anos, artista plástico, morador do Lago Norte