29/08/2020 às 09:09, atualizado em 31/08/2020 às 15:28

Árvores: das podas às compostagens

DF é uma das unidades da Federação mais arborizadas. Por ano, GDF investe mais de R$ 40 milhões no cuidado com o verde e emprega cerca de 1,5 mil

Por Lúcio Flávio, da Agência Brasília * I Edição: Carolina Jardon

Fotos: Paulo H Carvalho / Agência Brasília

Poucas pessoas sabem, mas no Distrito Federal todo o trabalho de poda de árvores e manutenção da natureza é revertido em composto orgânico que tem como destino final adubar mais de cinco milhões de árvores em toda região – 1,5 milhão só no Plano Piloto –, jardins e canteiros de flores.

O trabalho complexo de aproveitamento de resíduos ambientais é desenvolvido há mais de 10 anos pela Novacap e faz toda a diferença na imagem da capital do país que já é famosa pelos lindos canteiros de flores e árvores exóticas e frutíferas espalhadas pelas vias.

“Brasília é uma das cidades mais arborizadas do mundo, plantamos mais de 60% de árvores nativas e ainda temos as remanescentes. As demais espécies cultivadas são adaptadas ao clima e ao solo do cerrado”, explica Raimundo Silva, responsável pelo Departamento de Parques e Jardins (DPJ) da empresa pública.

“A maioria requer adubação orgânica na fase inicial de produção. Depois de plantadas no período chuvoso, resistem à seca e têm rápido desenvolvimento”, observa. Além do Plano Piloto, regiões administrativas como Sobradinho e Gama se destacam cada vez mais entre que apresentam mais árvores no DF.

O trabalho de poda é intenso e diário. O processo começa com as solicitações de moradores pelo serviço da ouvidoria da Novacap. De segunda a sexta, da primeira hora do dia ao entardecer, servidores trabalham em diversas áreas da cidade. No momento, são 43 equipes encarregadas pela jardinagem e limpeza.

O investimento da empresa pública nessa atividade, mais a compostagem e replantio das espécies, é de R$ 40 milhões anuais, gerando entre 1.500 empregos diretos e indiretos.

“Além das solicitações dos cidadãos, a Novacap tem suas próprias demandas no dia a dia. Esse é o dever da empresa, uma vez que ela é responsável por manter a arborização de Brasília”, reforça Raimundo.

Após avaliada a real necessidade da demanda por um engenheiro, é especificado o tipo de técnica a ser feita na árvore. Pode ser desde uma simples retirada de galhos mortos, limpeza da área, passando pela redução da altura para evitar a obstrução de iluminação urbana ou contato com fios elétricos até o levantamento da copa, ou –  como gosta de dizer o pessoal do ramo –  “levantamento da saia”.

“Geralmente o trabalho dura um dia inteiro, depende do local e da complexidade da demanda. Aqui, por exemplo, tivemos que interditar a Esplanada [dos Ministérios] para a retirada de uma árvore”, explica Francisco, que supervisionava um grupo de 15 homens próximo ao Palácio do Planalto.

No próprio local da poda é feita a trituração das folhas secas e galhos, por um equipamento acoplado na traseira de um caminhão. O destino desse material despedaçado, juntamente com os troncos de médio e grande portes, é o Viveiro II da Novacap, localizado no Setor de Oficina Norte (Sofn). Ali, o fluxo de chegada e saída desse material é intenso o dia todo. Basta olhar e verificar que os 78 hectares de área estão cheios de troncos de madeiras.

É no Viveiro II da Novacap que é feito o processo de transformação dos resíduos vegetais em composto orgânico, e o armazenamento de madeira para leilão. Geralmente, os lotes de madeiras mais nobres, como mogno, são arrematados por empresas fabricantes de móveis ou artesanatos.

As de qualidade inferior são destinadas para fornalhas de indústrias fabricantes de cimento ou cerâmicas, por exemplo.

No último leilão, realizado on-line, por conta da pandemia, a Novacap arrecadou mais de R$ 200 mil com o material. O dinheiro é revertido aos cofres públicos do GDF. “A intenção não é produzir madeira, mas manter a arborização da cidade”, esclarece Raimundo Silva.

Adubo orgânico

Logo cedo, um caminhão caçamba encosta na área de armazenamento de madeira e sobras de podas do Viveiro II da Novacap, no Setor de Oficina Norte. Com um pedido de solicitação em mãos, o motorista pergunta ao supervisor da área, João Sérgio Teixeira, onde pode pegar adubo composto orgânico. O produto, 100% desenvolvido no local, seria levado para um canteiro na entrada do Lago Norte.

Eis a utilidade do adubo feito a partir de restos dos galhos e folhas das podas diárias realizadas em todo DF. Ou seja, servir de fertilizante para jardins e árvores de várias espécies cultivadas que temos pela cidade.

O processo, artesanal e biológico demanda estrutura específica e leva de dois a três anos para ficar pronto. É o que conta João Sérgio com mais de 22 anos de experiência. “Quando o material vem mais fino do processo de trituração, talvez com um ano, um ano e meio, já está pronto para ser usado como adubo”, ensina.

Na prática, tudo funciona da seguinte forma: chegando ao local, o material triturado das podas em caminhões caçambas é despejado numa grande vala de 80 metros de comprimento, por 3 metros de altura. Logo em seguida, esses resíduos orgânicos são misturados com grande quantidade de terra para curtir o tempo necessário para virar adubo.

O resultado desse processo é a conhecida compostagem aproveitada, diariamente, na adubação de milhares de mudas do Cerrado criadas nos viveiros I e II da Novacap. Cerca de 60 reeducandos são responsáveis pela produção de mudas nos dois locais.

“A tendência é essa. Temos sempre que lembrar que as coisas não podem ser desperdiçadas. A poda, o cuidado com as árvores, é um processo natural, e aproveitar, destinar esse material para iniciativas como essas é de suma importância ambiental e econômica”, salienta Janaína Lima Martins Gonzáles, chefe da divisão de Agronomia da Novacap. “Essa compostagem que utilizamos diminuiu a utilização de outros tipos de adubos”, comenta.

A ideia do composto orgânico criado pela Novacap é tão eficiente que tem sido apresentado para pequenos produtores do DF por técnicos da Emater. Só no ano passado, servidores da empresa que presta assistência técnica e extensão rural ao DF, visitaram sete agricultores locais.

Em 2020, entre pedidos e atendimentos, até o momento, já foram 15. “As visitas são importantes na orientação para o uso dos compostos em áreas de produção consolidada”, defende o gerente de Meio Ambiente da Emater-DF, Marcos Maia. “Ajudamos com explicações dos principais benefícios do composto na qualidade física e biológica do solo, assim como sua fertilidade”, explica.

 

* Neste domingo (30), leia a segunda reportagem da série – Verde que te quero verde: Brasília, a cidade das árvores