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31/01/2022 às 15:32, atualizado em 31/01/2022 às 20:52
Cem voluntários receberam R$ 5 mil cada um; uma forma de valorizar o trabalho e motivar essas pessoas para que continuem a desenvolver o projeto
Quando o professor Aurélio Oliveira Marques nasceu, o Programa de Extensão Bibliotecária Mala do Livro já contava seis anos. Hoje, aos 26, o morador de Samambaia é agente de leitura desde 2008. Ele e mais 99 voluntários foram contemplados com R$ 5 mil em edital de premiação lançado pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Secec) no final de 2021, cujo objetivo foi valorizar o trabalho e a dedicação desses profissionais.
Para além dos R$ 500 mil aportados em prêmios, a pasta também investiu R$ 1,2 milhão na capacitação desses agentes. Aurélio e outros voluntários premiados falam, com emoção, sobre a mais bem-sucedida política pública de estado no incentivo à leitura na periferia e entorno da capital federal. “É que participo da Mala do Livro desde a mais tenra idade”, justifica o professor.
Ele era leitor assíduo na biblioteca domiciliar de uma pioneira das bibliotecas domiciliares de Samambaia, Maria das Dores. “A Mala proporcionava vários momentos educativos e culturais”, explica ele, referindo-se a oficinas de contação de histórias, gincanas de leituras, passeios, sessões de cinema no Cine Brasília e feiras de livros.
[Olho texto=”“A premiação representou um reconhecimento pelo trabalho árduo de tantos anos, em favor do livro e da leitura”” assinatura=”Marluce Franklin, agente da Mala do Livro desde 1994″ esquerda_direita_centro=”direita”]
“Eram atividades que ficavam no Plano Piloto, longe da periferia. Eu me sentia muito privilegiado em fazer parte disso. E a gente hoje sabe que a Mala do Livro tem essa capilaridade, democratizando acesso à alfabetização e ao livro”, testemunha.
A gerente da Mala do Livro, Maria José Lira Vieira, que trabalha com a iniciativa desde seu surgimento, homenageia a “das Dores” citada por Aurélio, também premiada no edital da Secec: “Ela sempre buscou se aperfeiçoar para oferecer melhorias para os leitores. Fez até curso de dinamização, iniciação teatral e arte de contar histórias. Muito guerreira, carrega uma filha deficiente nas costas e trabalha com muito prazer”.
Aurélio entende que o prêmio representa o reconhecimento pelo trabalho voluntário e é uma motivação para que as pessoas continuem a realizar essas ações. “Apesar do formato de prêmio individual, os recursos acabam beneficiando a comunidade como um todo”, acredita.
Transformação
Marluce Franklin, de Sobradinho, afirma que “a premiação representou um reconhecimento pelo trabalho árduo de tantos anos, em favor do livro e da leitura”, ações que considera “transformadoras”. Ela viu a metamorfose na própria vida. Agente desde 1994, está concluindo graduação em biblioteconomia.
“Nas bibliotecas domiciliares, a maioria em nossas residências, pudemos ver jovens, crianças, adolescentes e adultos mudando suas vidas, transformando realidades, alcançando crescimento pessoal por meio do conhecimento”, testemunha com entusiasmo.
Marluce, que está à frente da Associação dos Agentes de Leitura e contadores de estórias (Aaconte), com 98 agentes associados para buscar capacitação dos envolvidos, atua na Fercal, Sobradinho II e em regiões mais distantes, “como nos assentamentos, onde não existem bibliotecas nem qualquer estrutura pública da cultura”.
Ela diz que os agentes representados na Aaconte vinham reivindicando editais para qualificar o trabalho deles desde 2014. “A capacitação melhora nosso trabalho junto à comunidade. O secretário Bartolomeu Rodrigues é um divisor de águas em nossa história, por nos atender, nos acolher, nos dar voz”, afirma.
A agente conta que decidiu participar da Mala do Livro por gostar de ler e também por querer fazer algo para se contrapor à violência na própria região. Suas ações na divulgação do livro geraram interesse na comunidade e a casa dela ficou pequena para receber os leitores, pois a biblioteca domiciliar também passou a emprestar livros para os alunos do ensino médio que participam do Programa de Avaliação Seriada (PAS) e precisam ler as obras indicadas para o acesso à Universidade de Brasília (UnB). Isso a levou a mobilizar a comunidade para a construção de uma biblioteca na região administrativa.
[Olho texto=”“Acredito que por meio da leitura e dos livros pode haver transformação social e, consequentemente, uma sociedade mais justa”” assinatura=”Edson Cavalcante de Araújo, agente há 14 anos” esquerda_direita_centro=”esquerda”]
Público jovem
Edson Cavalcante de Araújo, agente há 14 anos e também premiado, aposta no livro como fator de desenvolvimento: “acredito que por meio da leitura e dos livros pode haver transformação social e, consequentemente, uma sociedade mais justa”. “A premiação é uma forma de reconhecimento por parte da Secretaria de Cultura e tem um significado muito importante não só para mim, mas para todos os agentes de leitura do programa”, opina.
Na casa dele, antes da pandemia, ele atendia a média de 20 a 30 crianças por mês. Com o avanço da vacinação, seu público começa a voltar. Cita o caso de Lara Neres, 10 anos, que mal saiu do posto de saúde e deu o ar da graça. “Ela gosta de contos de fada, ação e lê até quatro livros por mês”, relata Edson.
Dignidade
A advogada Alana Barros Siqueira Duarte considera a premiação “o reconhecimento para uma classe que até então não era lembrada, apesar de sua grande importância para a sociedade”. Agente desde 2012, ela conheceu o programa por meio de uma amiga, o que mostra a força do boca a boca na propagação da Mala, uma caixa de madeira que se converte em estantes para cerca de 200 livros.
“Eu decidi participar desse lindo trabalho, pois sempre achei essencial a continuidade do conhecimento através da leitura, e como agente de leitura podemos transformar vidas, trazer novas esperanças e crescimento intelectual e de caráter para uma sociedade que tem caminhado para o esquecimento dos livros”, justifica.
A biblioteca domiciliar funciona na casa da advogada, mas ela geralmente trabalha em conjunto com o marido no atendimento a moradores de rua três vezes na semana com alimentação, vestuário, com o banheiro sobre rodas e livros “para que eles venham a se sentir dignos”, enfatiza.
Diálogos
O músico Douglas Gomes Bezerra, morador do Guará, é agente da mala há cinco anos. Também premiado, diz que decidiu participar porque já tinha uma pequena biblioteca em sua escola de musicalização, onde ensina guitarra, violão e outros instrumentos. Em busca de livros, Douglas conta que ele recebe entre 10 a 20 pessoas por dia.
Ele não tem dúvida sobre a convergência entre a música e as letras e se arrisca a sugerir que a Mala do Livro busque ampliar os diálogos no campo das humanidades. “Devemos continuar fazendo uma ótima gestão desse legado, na luta para o livro chegar na mão de todos”, advoga.
[Olho texto=”Neste momento, a Biblioteca Nacional de Brasília (BNB) estuda a encomenda de mais caixas para atender a uma demanda reprimida. Há quase uma centena de candidatos a acolher bibliotecas domiciliares” assinatura=”” esquerda_direita_centro=”esquerda”]
Agentes de leitura
Neste momento, a Biblioteca Nacional de Brasília (BNB), que gerencia a Mala do Livro, estuda a encomenda de mais caixas para atender a uma demanda reprimida. Segundo Maria José, há quase uma centena de candidatos a acolher bibliotecas domiciliares.
“Temos esse cadastro de reserva com inscritos preparados para receber a Mala. Um agente ou uma agente recebe capacitação e precisa ter a predisposição de receber a minibiblioteca. Avaliamos o perfil da pessoa, o espaço de que dispõe, seu interesse por livros e a capacidade de prestar o devido atendimento ao público”, explica a gerente.
Para tornarem-se agentes, os interessados devem se inscrever na gerência do programa em maladolivro@gmail.com
*Com informações da Secretaria de Cultura e Economia Criativa