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05/03/2023 às 11:03, atualizado em 06/03/2023 às 10:47
Doações e contrapartidas ajudam a contar a história da arte brasileira do século 20
Um retrato produzido em grafite sobre papel por Di Cavalcanti, em 1943. Uma gravura em cores de Anna Letycia, feita em 1970. Outra gravura em preto e branco, de Djanira, produzida em 1968. E até mesmo uma icônica calcogravura de Portinari, datada de 1949. Essas são algumas das obras que agora compõem o acervo do Museu de Arte de Brasília (MAB) e, com isso, ajudam a apresentar para a população do Distrito Federal e seus visitantes a história da arte brasileira do século 20.
Construído na década de 1960 e inaugurado em março de 1985 para ser o primeiro museu de arte da nova capital do país, o MAB ficou fechado por 14 anos e, em 2021, foi finalmente reaberto. Um dos equipamentos culturais de Brasília sob gestão da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF (Secec), ele hoje recebe uma média de 2,5 mil visitantes por mês, consolidando-se como singular espaço de preservação e interpretação das artes visuais localmente.
O acervo do museu é formado por cerca de 1.400 peças, entre quadros, esculturas, mobiliários e outros tantos objetos carregados de conceitos, significados e preciosos valores estéticos. E essas coleções estão, continuamente, sendo atualizadas e construídas. “O acervo do MAB é um dos mais importantes em artes visuais da cidade, mas tinha várias lacunas que precisavam ser preenchidas. E isso tem acontecido de três formas: por doações, por transferência de outros setores da Secec e por contrapartidas pelo uso do MAB ou da Concha Acústica”, explica o gerente do espaço, Marcelo Jorge.
As doações, em geral, são feitas pelos próprios artistas ou por colecionadores, interessados em ter a peça musealizada – já que isso impacta tanto no valor de mercado quanto na divulgação daquela obra ou autor. Como exemplos de doações, Marcelo cita três obras de Cícero Dias, pioneiro do modernismo no Nordeste, além de gravuras de Debret, Rugendas e Arnoldus Montanus que agora também fazem parte da narrativa promovida pelo MAB. A outra maneira é por transferência de peças dentro da própria Secec, que possui, nos diversos espaços culturais sob sua gestão, um variado acervo de arte. Serigrafias de Siron Franco e de Athos Bulcão são modelos de peças que foram para o museu por meio desse tipo de acordo.
No caso das quatro obras citadas no início do texto, no entanto, a aquisição se deu por contrapartida pelo uso da Concha Acústica, que é um desses equipamentos geridos pela secretaria e vinculado ao MAB. A vantagem dessa opção, segundo Marcelo, é que, assim, o museu pode escolher as obras de que precisa, traçando uma melhor estratégia para preencher as lacunas do acervo.
Funciona assim: o interessado em utilizar os espaços da Concha ou do próprio MAB para fins privados, com cobrança de bilheteria eventualmente, pode “pagar o aluguel” por meio da doação de uma obra de arte. “A gente apresenta uma lista de importantes artistas que ainda não temos no acervo. O interessado nos apresenta opções de obras disponíveis e fazemos a seleção. A partir disso, é feito um acordo de patrocínio privado direto, em que a pessoa doa aquelas obras e, em troca, utiliza esses espaços. Foi assim que conseguimos adquirir nomes que ainda não tínhamos nas coleções da Secec, mais ou menos conhecidos, mas muito relevantes para a história da arte”, explica o gerente.
Quem participa da parceria aprova prontamente a negociação. Jorge Luiz é sócio-administrador da produtora Giral Projetos, que transformou o uso da Concha Acústica para o show do ator e comediante Fábio Porchat em uma obra de Cândido Portinari. Já a apresentação do influenciador Deive Leonardo foi convertida na aquisição de uma serigrafia de Judith Lauand e outra do húngaro Victor Vasarely, primeiro grande nome internacional do acervo do MAB. “Foi uma experiência incrível! Já havíamos participado de ações em que doamos serviços e equipamentos técnicos. Mas ter a oportunidade de doar obras de artes nos enche de orgulho, pois isso estará sempre contando parte de nossa história”, celebra.
Para Cinara Barbosa, curadora e professora do Departamento de Artes Visuais da Universidade de Brasília, é fundamental que a sociedade entenda esses trânsitos como uma possibilidade prazerosa de contribuir com a formação do repertório imagético, artístico e museológico da cidade, entendendo o acervo também como oportunidade de acessar outras formas de conhecimento. “A instituição tem ciência de que isso pode ocorrer, mas é preciso sinalizar para a sociedade que esse interesse pode ser espontaneamente dela”, argumenta.
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Cinara conhece bem a história do MAB, pois integrou um projeto de residência artística no museu, realizado dentro do canteiro de obras durante sua reforma. Sob essa perspectiva é que ela observa a relevância da participação da sociedade na compreensão e na fruição do museu. “A população e os artistas precisam entender que a instituição [MAB] é um espaço para a cidade, que pode funcionar para a pesquisa, para lazer, para conhecimento. Precisam entender a importância desse espaço, com todas as suas problematizações, mas refletindo sobre de que forma a gente pode criar condições para que esses projetos sejam comentados e revisitados, e que essa discussão que a arte contemporânea provoca em seus próprios processos e modos de fazer ganhe mais visibilidade, pois a arte e os espaços da arte têm que estar em circulação”, conclui.
*Com informações da Secec