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19/04/2023 às 16:21, atualizado em 19/04/2023 às 16:57
Atuação da comunidade foi decisiva para que os bairros fossem regularizados e os operários da construção de Brasília pudessem ter a posse definitiva de suas casas
Em meio ao Plano Piloto há duas localidades que quebram toda a lógica do quadradinho e têm culturas bem diferenciadas: as vilas Planalto e Telebrasília. À época da construção da cidade, esses locais eram acampamentos temporários dos operários de várias construtoras. Uma sequência de luta e resistência marcou a caminhada dos pioneiros e seus familiares que se dedicaram a conquistar a regularização das duas vilas.
João Almeida, 60, é morador da Vila Telebrasília desde 1979. Ele veio do interior do Maranhão em busca de melhores condições de vida e foi um dos protagonistas na luta pela fixação do bairro.
“Na década de 1980, nossas reivindicações eram por melhorias nos acampamentos”, lembra. “Depois disso, perto de 1988, o nosso foco mudou e passou a ser pela fixação definitiva. Eu participei de vários movimentos estudantis e da comunidade. Foram aproximadamente 20 anos nessa luta.”
Em 1993, os moradores da Vila Telebrasília conquistaram o decreto aprovado na Câmara Legislativa do DF para a fixação do bairro. Mas a luta não parou por aí. Com o governo subsequente, em 1999, houve a revogação desse decreto. “Eles queriam que fôssemos para o Riacho Fundo”, conta João. “De todo jeito queriam nos tirar aqui da Vila. Nós fizemos audiência pública na OAB com a participação de vários órgãos do Executivo Federal, e foi quando conseguimos mostrar a nossa força”.
Urbanização
Somente em 2006 o decreto de fixação começa a valer e, em 2007, inicia-se o processo de urbanização da Vila Telebrasília. Em 2008, os moradores começaram a receber as escrituras dos 500 lotes regularizados.
“A Vila Telebrasília é o resultado concreto da luta de seus moradores”, reitera João. “Foi graças à nossa capacidade de nos comunicar com a sociedade que conseguimos esse apoio. O sentimento é, sem sombra de dúvida, de muito orgulho em ter participado dessa luta coletiva. Tivemos nossa cidadania conquistada e respeitada.”
João elogia a estrutura atual da Vila Telebrasília: “Hoje nós temos um lugar organizado. Nós tivemos a primeira revitalização do nosso campo sintético, que estava com mais de 15 anos de uso. Houve também melhorias nos parquinhos, reformas na quadra de esportes, e a expectativa é que a creche comunitária seja inaugurada em breve”.
Vila Planalto
Outro local que também representa o berço de Brasília é a Vila Planalto. Assim como na Vila Telebrasília, o bairro nasceu com acampamentos temporários de operários que vieram trabalhar na construção da capital federal. Os acampamentos passaram pelo processo de remoção entre 1960 e 1985.
Filha de um pioneiro — que chegou a Brasília de “pau de arara” vindo do Ceará e ajudou na construção do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional, do Teatro Nacional e da Torre de TV —, Leiliane Rebouças, 47, também foi protagonista na luta pela fixação da Vila Planalto, que hoje é tombada pelo patrimônio histórico.
“Eu cresci vendo a remoção de barracos na Vila Planalto durante a ditadura”, lembra. “Nós não podíamos nos organizar para lutar pelos nossos direitos. Quando eu tinha 10 anos de idade, escrevi uma carta ao então presidente da República, José Sarney, contando como viviam os operários e dos riscos de serem expulsos de seus acampamentos na Vila.”
Passaram-se dois anos em negociação entre o governo e os moradores da Vila Planalto até que, em 1988, o local foi considerado patrimônio histórico do DF, e o então governador, José Aparecido de Oliveira, assinou o decreto de fixação da região.
Na época da construção de Brasília, eram 22 acampamentos, abrangendo uma área de aproximadamente 320 hectares. Depois de inúmeras tentativas de desocupação, restaram cinco acampamentos, com 1.100 famílias que conseguiram o direito de permanecer no local.
História
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“A Vila Planalto representa, para mim, a nossa história; é o berço de Brasília”, afirma Leiliane. “Eu penso que nós temos que honrar quem veio antes, quem construiu essa cidade, a luta, o esforço e o trabalho dos candangos que construíram Brasília. Sem eles, Brasília não seria o que é hoje. Me engajei muito na preservação da vila para honrar a história dos candangos, que são os meus pais.”
Na Vila Planalto, uma antiga residência de um engenheiro que trabalhava na construção de Brasília abriga hoje o Quintal da Vila, um restaurante cuidado por Raquel Carrilho, 46, e sua família. Com a arquitetura original, o restaurante teve suas instalações restauradas sem tirar a história por trás de cada cômodo.
“Foram mais de cinco anos para revitalizar a casa inteira”, conta Raquel. “É muito caro para manter a originalidade. Nós não tínhamos dinheiro, minha mãe vendia biscoito no Senado e nós vendíamos marmita. Só em 2018 começamos o processo de restauração. Para nós, é importante manter isso aqui o mais perto de como era, porque é a nossa história. São espaços que remetem às várias fases por que passamos, de pura história da nossa cidade e da nossa família.”