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15/08/2019 às 12:21, atualizado em 15/08/2019 às 17:31
Além de erguer as primeiras edificações, empresários ainda se preocupavam em manter cada detalhe da nova cidade
Para que Brasília fosse erguida, foram necessárias pessoas que não tivessem medo de apostar no desconhecido. Mais do que acreditar, os primeiros construtores da nova capital tiveram que investir dinheiro, vencer as adversidades do tempo e, ao longo dos anos, lutar contra crises econômicas para que as empresas pioneiras que ajudaram a levantar a cidade em meio a poeira e mato continuassem a todo vapor.
César Peres aceitou o desafio do irmão mais novo, Alberto Peres: veio para Brasília em 1960, mesmo sem saber se o solo vermelho do Cerrado lhe renderia frutos. Com o dinheiro que havia juntado antes de se mudar para a recém-inaugurada capital, fundou a construtora Ipê, em 1961, em Taguatinga. “Meu pai era um construtor nato, mesmo não sendo formado. Ele sempre teve paixão por essa área. Não é à toa que isso foi passado para mim e para meu filho”, lembra Júlio Peres, 64 anos, um dos cinco filhos do engenheiro. O pioneiro faleceu em 2001, aos 83 anos, devido a uma pneumonia e complicações cardíacas.
[Olho texto=”Meu pai era um construtor nato, mesmo não sendo formado. Ele sempre teve paixão por essa área. Não é à toa que isso foi passado para mim e para meu filho” assinatura=”Júlio Peres, filho do construtor pioneiro César Peres ” esquerda_direita_centro=”esquerda”]
Mesmo vivendo em uma cidade de incertezas, coragem era o sentimento que César esbanjava. “Ele era um itinerante, gostava do desafio, de coisas novas. Participar da construção foi um momento de muita alegria”, comenta Júlio. A firma, que começou com 20 funcionários e atualmente está na sua segunda geração, com 200, foi responsável pelos primeiros prédios e lojas das cidades de Brasília, como alguns de Taguatinga.
“Meu avô tinha uma visão de futuro, e isso o ajudava a alavancar os negócios. Ele conseguiu vender esses locais a prestação, e as pessoas, mesmo não o conhecendo, compravam porque acreditavam nele. É muito difícil confiarmos nos outros, mas ele era extremamente cativante e correto”, afirma o neto do pioneiro, César Peres Neto, 37 anos.
Para a família, uma das receitas do sucesso da construtora era o relacionamento com os funcionários. Ao mesmo tempo em que era sério e exigente, conta Júlio, César tratava todos com igualdade. “Ele era uma pessoa muito humana. Comprava lanche para pessoal, se preocupava se o trabalhador voltaria com segurança para casa quando o expediente acabava e se o empregado estava evoluindo profissionalmente”, recorda o filho, que acompanhou o pai em muitas obras.
Atualmente à frente da construtora Ipê, filho e neto não escondem a admiração pela pessoa e pelo profissional que César foi. “Quando encontro conhecidos do meu avô, todos elogiam a forma correta como ele agia. Isso moldou nossa família e nos espelhamos muito nele”, diz César Neto. Júlio destaca o cuidado que o pai tinha ao entregar uma obra: “Quem está recebendo um imóvel tem a esperança de um local novo, com momentos diferentes. Claro que a empresa visa ao lucro, mas ele sempre prezou a responsabilidade social e ambiental”.
Também egresso dos primórdios da cidade, o engenheiro Luiz Carlos Botelho chegou após muita batalha na vida. Começou a trabalhar aos 7 anos, como vendedor de leite. Depois foi engraxate, sapateiro e lavador de ônibus. Veio para Brasília em 1956, com a família. O pai dele foi convidado pelo ex-presidente Juscelino Kubitschek para montar a parte administrativa da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap).
Inicialmente, Luiz, aos 14 anos, trabalhou como office boy da companhia. Depois, fez um curso de datilografia e começou a ajudar os advogados da Novacap a redigirem contratos, até ser promovido para um cargo de chefia no local, aos 16 anos. Aos 19, foi cursar engenharia civil na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), posteriormente tendo sido aprovado no vestibular da Universidade de Brasília (UnB) para o mesmo curso.
“Ele praticamente sustentava a família. Meu avô parou de trabalhar e minha avó cuidava da minha tia, que ainda era pequena”, lembra um dos quatro filhos de Luiz Pedro Henrique de La Roque, 37 anos. Logo Luiz conseguiu um emprego em uma empresa pioneira de Brasília, a Eldorado Construtora. Lá ele foi o engenheiro responsável por construir o viaduto da W3 – que liga a W3 Sul e Norte – , o edifício da Telebrás, os primeiros prédios da Asa Norte e o Clube do Exército de Brasília.
O filho recorda de um episódio triste, mas com um final feliz, sobre o clube. O local pegou fogo, e, com o orçamento apertado, pela primeira vez, Luiz se desesperou. “Um dia, enquanto ele chorava sem saber o que fazer, um ajudante da obra disse: ‘a vida é dura para quem é mole’. Foi o suficiente para ele levar essa frase para o resto da vida”, comenta Pedro Henrique. Com uma “ginástica” financeira, o engenheiro conseguiu o dinheiro para terminar a obra.
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Em 1979, Luiz fundou a LDN Empreendimento, com mais dois engenheiros. O nome fazia referência às iniciais dos nomes dos sócios. Após oito anos e com a saída dos outros integrantes, nasceu a construtora LDN. Luiz passou a contar com a ajuda de Pedro Henrique na direção da empresa e, juntamente com toda equipe, fez a restauração do Museu do Catetinho, da sede do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob) e da Confederação Nacional da Indústria (CNI), além de construções de embaixadas e outras fora da capital. São cerca de 250 obras espalhadas entre Brasília, Tocantins, Goiás e Mato Grosso do Sul.
[Olho texto=”Era como se Brasília fosse a casa deles, que tinham que cuidar porque participaram de toda a construção” assinatura=”Pedro Henrique de La Roque, engenheiro civil ” esquerda_direita_centro=”esquerda “]
Pedro Henrique lembra que o pai sempre acreditou no desenvolvimento de Brasília. “Antigamente era bem diferente de hoje em dia. As pessoas tinham muita preocupação com as diretrizes da cidade. Era como se Brasília fosse a casa deles, que tinham que cuidar porque participaram de toda a construção”, recorda. Para o filho, a sucessão dos negócios se deve à honestidade do pai, que faleceu no ano passado por complicações cardíacas. “Ele não desistia nunca e sempre pensava na evolução dos funcionários. Há pessoas que estão aqui há mais de 30 anos e começaram de baixo”, afirma.
Segundo o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Cláudio Queiroz, Rio de Janeiro e São Paulo são a origem da maioria dos empresários que estavam dispostos a montar o negócio na nova capital. “Inicialmente, os primeiros empreendimentos feitos em Brasília eram autarquias do governo, como Banco do Brasil, Caixa Econômica, Clube do Exército, Instituto de Aposentadoria e Pensão”, explica.
Para o docente, tanto os empresários quanto aqueles que colocavam a “mão na massa” participaram de um grande salto tecnológico na construção civil. “As características das obras eram inovadoras. Eles tiveram uma evolução tecnológica tanto para assumir os prazos de construção quanto para interpretar a arquitetura da época. Cada construtor compreendeu a nobreza da perspectiva de Brasília”, comenta.